I INTRODUÇÃO
Cantiga da velha mãe e dos seus dois filhos
Ai o meu pobre filho, que rico que é
ai o meu rico filho, que pobre que é
Nascidos do mesmo ventre
Um vive de joelhos pró outro passar à frente
E esta velha mãe para aqui já no sol poente
Um dia há muito tempo, vi-os partir
levando cada um do outro o porvir
Seguiram pela estrada fora
Um voltou-se para trás, disse adeus que me vou embora
Voltaremos trazendo connosco a vitória
De que vitória falas, disse eu então
Da que faz um escravo do teu irmão?
Ou duma outra que rebenta
como um rio de fúria no peito feito tormenta
quando não há nada a perder no que se tenta?
Passaram muitos anos sem mais saber
nem por onde passavam, nem se por ter
criado os dois no mesmo chão
eram ainda irmãos, partilhavam ainda o pão
E o silêncio enchia de morte o meu coração
Depois vieram novas que o que vivia
da miséria do outro, se enriquecia
Não foi para isto que andei
dias que foram longos e noites que não contei
a lutar pra ter a justiça como lei
Às vezes rogo pragas de os ver assim
Sinto assim uma faca dentro de mim
Sei que estou velha e doente
Mas para ver o mundo girar de modo diferente
Ainda sei gritar, e arreganhar o dente
Estou quase a ir embora, mas deixo aqui
duas palavras pra um filho que perdi
Não quero dar-te conselhos
Mas se é teu próprio irmão que te faz viver de joelhos
Doa a quem doer, faz o que tens a fazer
Sérgio Godinho, in "os sobreviventes", 1971
II - MÁRIO SOARES
Mário Soares escreve hoje no "Diário de Notícias" um artigo de opinião intitulado "Pobreza e Desigualdades", a propósito do Relatório da União Europeia e do trabalho de CESIS, coordenado pelo Prof. Alfredo Bruto da Costa, "Um olhar para a pobreza em Portugal".
A linhas tantas, Mário Soares afirma que "a pobreza e a riqueza (ostensiva e muitas vezes inexplicável) são o verso e o reverso da mesma moeda e o espelho de uma sociedade a caminho de graves convulsões",
Num tempo em que tantos socialistas se deixam vencer pelo conformismo, pela cedência ao liberalismo económico e pela aceitação do fado capitalista, é bom ouvir-se a voz insubmissa de um dos fundadores do Partido Socialista, no fundo a sua grande figura.
Ainda há quem compreenda as lições do Pe. António Vieira, quando este diz que são precisos muitos peixes pequenos para alimentar um peixe grande.
1 comentário:
INFELIZMENTE A "RUAMA" TÁ CADA VÊZ MAIS LIXADA,NÃO HÁ MANEIRA DE SE LIVRAR DOS "TUBARÕES"
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