segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Discurso de oão Carlos Gouveia na ALM a 16/10

«Excelentíssimo senhor presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, senhoras e senhores deputados:A crise do sistema financeiro à escala global ajuda-nos a clarificar o modelo económico regional dos últimos 30 anos. Reforça, por assim dizer, o olhar crítico dos madeirenses sobre as opções políticas erradas de um mesmo governante. Não há nem povos superiores nem recursos financeiros para todo o sempre. E fazer da governação um exercício ideológico constante é tão irracional como pensar que o sistema financeiro global tem capacidade para se regular por si próprio.Na verdade, a cultura clientelar que se instalou na Madeira, à conta de um modelo totalitário de poder, tem premiado os medíocres, gente que geralmente apresenta à conta de virtude o seu cartão laranja ou o silêncio dos cúmplices. A subsídio-dependência em que vivem associações, clubes e até cidadãos serve os interesses de quem se procura preservar no poder. O cartão partidário, a bandeirinha na casa, os passeios nas comitivas têm servido de salvo-conduto para o emprego, para a habitação, para a promoção social. Valiam sempre mais que o valor, que o mérito.A união regional à volta do PSD reúne-se à volta da palavra autonomia. Mas esta autonomia é de pendor separatista, como aqueles que sabem interpretar discursos simples claramente percebem. No site do Governo Regional, o seu presidente afirma que a Autonomia política resulta de uma organização de massas que lutou, entre 74 e 76, contra os radicalismos dos partidos políticos que, no seu entender, queriam manter o "status colonial". E ataca-se os adversários desta autonomia de pendor separatista de "colaboracionistas com Lisboa", como se, de facto, a capital do país, ou o próprio país fosse o inimigo externo da família que vive a "fraternidade autonómica".A união regional à volta do PSD tem funcionado como uma irmandade, uma família, onde os seus elementos se juntam à volta da mesma mesa, a mesa do orçamento regional. Como nas grandes famílias, há as hierarquias: O pai de todos, os padrinhos e os compadres. Uns vivem melhor do que outros, mas todos podem sentir a protecção perante os inimigos externos ao clã.Sempre uns madeirenses espezinharam a grande maioria dos seus conterrâneos. E nunca esses tais gostaram de mudanças profundas na sociedade. Sempre quiseram ver as populações amarradas à submissão, à pobreza e à ignorância. São os mesmo de sempre, os que odiaram a Revolução Liberal, em implantação da República e, mais recentemente, o 25 de Abril. São os mesmos de sempre, os que usurparam a Autonomia. Aqueles que chamam tudo a si. Os que delapidam o erário público e bloqueiam o avanço da cidadania na região.Senhoras e senhores deputados, os socialistas madeirenses contrapõem à sociedade clientelar, uma sociedade do mérito, da exigência e da responsabilidade individual. É por isso que redefinimos claramente a nossa acção política. Reforçamos o posicionamento ideológico, naquilo que deve ser hoje a social democracia e o socialismo democrático face ao capitalismo globalizado e ultraliberal. E reorientamos a afirmação autonómica - a Autonomia dos homens livres -, enquanto elemento diferenciador do projecto separatista e totalitário do PSD Madeira. Temos os nosso próprio caminho, é certo, mas balizado pelo mesmo horizonte e por um mesmo sentimento de pertença: sermos membros do Partido Socialista e partilharmos uma Pátria comum, com os continentais e os açorianos. É através desta separação de águas que vinculamos as nossas propostas e realizamos as nossas iniciativas.A crise financeira, económica e social da região tem, por conseguinte, a sua origem em pressupostos e ideológicos, seja num concepção totalitária de poder, seja numa concepção separatista da autonomia regional.Se em termos políticos podemos considerar esta vocação totalitária e separatista como uma espécie de novo fascismo, o modelo de desenvolvimento decorrendo da necessidade de perpetuação do poder conduziu a um fascismo social, onde a pobreza, as desigualdades e a exclusão ganham contornos cada vez mais incontroláveis.Definitivamente a Madeira não é um cantinho do céu. Se, no plano da governação regional, é completamente invisível aos olhos do cidadão comum a traficância de favores e a transferência de bons investimentos para as mãos dos privados, numa lógica de estado mínimo e numa ausência total de regulação, toda a gente pode constatar a desestruturação social que invadiu as nossas vilas e cidades.Por isso, não nos afirmamos como um projecto cívico de contra-poder, ou como um movimento contra-cultural, face à autocracia e ao totalitarismo, à plutocracia e ao separatismo. Queremos merecer a confiança dos madeirenses para assumirmos as mais altas responsabilidades de servirmos todos os cidadãos, porque, senhores deputados profetas do separatismo, a vossa pátria é a vossa barriga, a vossa barriga é a daqueles que durante anos e anos sugaram os recursos financeiros dos impostos dos madeirenses, das transferências do estado e da UE.Afirmamos que existe uma inacção governativa. O governo não governa. Prefere-se o conflito permanente com os órgãos de soberania, mascarando a realidade com a propaganda oficial. Faz-se chantagem com os madeirenses. E atribui-se todas as culpas da má governação regional ao Governo da República. Acicatar os madeirenses contra o inimigo externo é o que resta da estratégia para manter um poder absoluto. Em todos os países pobres do mundo faz-se o mesmo: instiga-se o ódio contra um inimigo externo e mantêm-se poderes totalitários e populações extremamente pobres.Só com governantes livres e libertos, imbuídos de uma ética republicana de serviço à causa pública, como exigirá um governo socialista madeirense, é que se poderia estancar a derrapagem financeira e relançar a economia regional para que o bem-estar e a qualidade de vida cheguem a todos.Esta é a hora da mudança, a hora da Autonomia dos homens livres, a hora dos madeirenses. Tenho dito.»Assembleia Legislativa da Madeira, 16 de Outubro de 2008.

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